terça-feira, 9 de julho de 2013

Educação ambiental como política pública

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022005000200010&lang=pt

Educação e Pesquisa

Print version ISSN 1517-9702

Educ. Pesqui. vol.31 no.2 São Paulo May/Aug. 2005

http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022005000200010 

EM FOCO: EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Educação ambiental como política pública


Marcos SorrentinoI; Rachel TrajberII; Patrícia MendonçaII; Luiz Antonio Ferraro JuniorIII
IMinistério do Meio Ambiente
IIMinistério da Educação e Cultura
IIIUniversidade Estadual de Feira de Santana



RESUMO
A educação ambiental surge como uma das possíveis estratégias para o enfrentamento da crise civilizatória de dupla ordem, cultural e social. Sua perspectiva crítica e emancipatória visa à deflagração de processos nos quais a busca individual e coletiva por mudanças culturais e sociais estão dialeticamente indissociadas. A articulação de princípios de Estado e comunidade, sob a égide da comunidade, coloca o Estado como parceiro desta no processo de transformação dostatus quo situado, segundo Boaventura de Souza Santos, como um "novíssimo movimento social". A tal Estado cumpre o papel de fortalecer a sociedade civil como sede da superestrutura. No campo ambiental, o Estado tem crescido em termos de marcos regulatórios sem uma capacidade operacional que condiga com a demanda em vista da redução do Estado (década de 1990) e da ausência de reformas que não sejam a do Estado mínimo. À educação ambiental cumpre, portanto, contribuir com o processo dialético Estado-sociedade civil que possibilite uma definição das políticas públicas a partir do diálogo. Nesse sentido, a construção da educação ambiental como política pública, implementada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) e pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), implica processos de intervenção direta, regulamentação e contratualismo que fortalecem a articulação de diferentes atores sociais (nos âmbitos formal e não formal da educação) e sua capacidade de desempenhar gestão territorial sustentável e educadora, formação de educadores ambientais, educomunicação socioambiental e outras estratégias que promovam a educação ambiental crítica e emancipatória. As políticas públicas em educação ambiental implicarão uma crescente capacidade do Estado de responder, ainda que com mínima intervenção direta, às demandas que surgem do conjunto articulado de instituições atuantes na educação ambiental crítica e emancipatória.
Palavras-chave: Educação ambiental – Políticas públicas – Sociedade civil – Ambientalismo.



A abordagem do Programa Nacional de Educação Ambiental reitera um entendimento, historicamente construído, dos desafios desta como processo dialético de transformação social e cultural. Grasmci considera a sociedade civil como sede da superestrutura (Bobbio, 1999), ou seja, é em seu âmbito que nasce a idéia de uma nova ordem e de novos valores que implicam uma nova estrutura, um novo Estado. O Estado, neste sentido, vive o paradoxo de ser representação de uma tese senescente ao tempo em que congrega atores e setores (na mão esquerda do Estado, em Bourdieu, 1998) que tendem a aliar-se à sociedade civil na transformação cultural e social e na função de estimular a transformação do próprio Estado nessas novas direções. Santos (1999) fala dessa perspectiva de ação do Estado como se ele próprio compusesse um "novíssimo movimento social".
A urgente transformação social de que trata a educação ambiental visa à superação das injustiças ambientais, da desigualdade social, da apropriação capitalista e funcionalista da natureza e da própria humanidade. Vivemos processos de exclusão nos quais há uma ampla degradação ambiental socializada com uma maioria submetida, indissociados de uma apropriação privada dos benefícios materiais gerados. Cumpre à educação ambiental fomentar processos que impliquem o aumento do poder das maiorias hoje submetidas, de sua capacidade de autogestão e o fortalecimento de sua resistência à dominação capitalista de sua vida (trabalho) e de seus espaços (ambiente).
A educação ambiental trata de uma mudança de paradigma que implica tanto uma revolução científica quanto política. As revoluções paradigmáticas, sejam científicas, sejam políticas, são episódios de desenvolvimento não cumulativo nos quais um paradigma antigo é substituído por um novo, incompatível com o anterior. Já as revoluções políticas decorrem do sentimento que se desenvolve em relação à necessidade de mudança. Tais revoluções não mudam apenas a ciência, mas o próprio mundo, na medida em que incidem na concepção que temos dele e de seu caminho (Kuhn, 1969). A educação ambiental, em específico, ao educar para a cidadania, pode construir a possibilidade da ação política, no sentido de contribuir para formar uma coletividade que é responsável pelo mundo que habita. Nesse sentido, podemos resgatar o pensamento de Edgar Morin, que vislumbra para o terceiro milênio a esperança da criação da cidadania terrestre. A política de educação ambiental desenvolvida no Brasil apresenta-se, assim como aliada dos processos que promovem uma "sociologia das emergências" (Santos, 2002), como estratégia para superar o paradigma da racionalidade instrumental que operou, no Brasil e no mundo, silenciamentos opostos à participação, à emancipação, à diversidade e à solidariedade.
Para enfrentarmos as causas mais profundas da erosão da diversidade precisamos conhecer a nós mesmos e nossos processos civilizatórios no sentido empregado por Boaventura de Souza Santos, quando nos convida à realização de uma arqueologia virtual do presente. Certamente encontraremos razões psicossociais, culturais, econômicas, educacionais, históricas e conjunturais, que delinearam um modelo devastador das relações estabelecidas entre os seres humanos e destes com o meio ambiente. Esse modelo, uma construção histórica baseada na erosão da diversidade biológica e cultural, homogeneiza saberes, sabores, paisagens, comportamentos, espécies e raças, por meio do estímulo ao consumismo, da comunicação de massas, da genética e por autoritarismos de todos os tipos.
A questão ambiental é típica do paradoxo vivido pelos Estados. Nas décadas de 1970 e 1980 vivemos um período no qual a doutrina neoliberal impôs o conceito de Estado mínimo, de regulação mínima, ao mesmo tempo em que a crescente complexidade da sociedade exigia mais regulação e maior inserção do Estado em novas questões. A sociedade sente a necessidade de mais Estado, enquanto a opinião pública posiciona-se mais como anti-Estado. Como aponta Sader (2005), o Capital vem clamando por Estado mínimo no que tange ao caráter público do Estado e Estado máximo para programas de crédito, socorros financeiros nas falências, incentivos às exportações, enfim, um Estado forte que garanta condições à expansão do mercado (Laurrel, 1995). Ainda vivemos ecos de uma maré neoliberal refratária à intervenção e à regulamentação estatal que teve seu auge nos anos de 1990, como aponta Bursztyn (1994), dentro da necessidade de reforma institucional do Estado que supere este paradoxo e represente uma maior eficácia na regulação.
Cavalcanti (1999) aponta educação, gestão participativa e diálogo entrestakeholders (atores, sujeitos sociais) como os três parâmetros fundamentais para a regulação ambiental. A mesma educação que vem deixando de ser direito público para ser espaço de investimento (Sader, 2005). O resgate do caráter público do Estado requer sua ampliação no âmbito da educação e do ambiente. Um Estado cresce quando suas funções históricas passam a demandar mais ação (crescimento horizontal do Estado) ou quando ele é impelido a assumir novas funções (crescimento vertical do Estado). Este último é qualitativo, enquanto aquele é quantitativo, de modo que a função reguladora do Estado no campo ambiental é um incremento qualitativo do Estado, ou seja, uma nova função.
Neste artigo tecemos algumas considerações sobre as políticas públicas voltadas à questão socioambiental, especificamente a educação ambiental, a qual tem por finalidade abrir espaços que possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos seres humanos e de todas as espécies e sistemas naturais com os quais compartilhamos o planeta ao longo dos tempos. Isso se dá ao assumirmos nossas responsabilidades individuais e coletivas, interligadas pelas circunstâncias sociais e ambientais. Responsabilidade exige, entre outras coisas, autonomia para a participação no debate de políticas públicas como, por exemplo, a qualidade da educação, o empoderamento de pequenos agricultores ampliando a oferta local e a diversidade de produtos de qualidade, a mudança na matriz energética e de transporte, a relação das comunidades locais com o lixo produzido e compromissos pelos bens comuns.

A educação ambiental, o papel do Estado e as políticas públicas
Para se entender educação ambiental como política pública, é interessante iniciar com os significados dessas palavras, contextualizá-lo na história do ambientalismo, inserindo-o nas agendas dos governos, assim como seus desdobramentos nas áreas da educação formal e não formal.
A palavra política origina-se do grego e significa limite. Dava-se o nome de polis ao muro que delimitava a cidade do campo; só depois se passou a designar polis o que estava contido no interior dos limites do muro. O resgate desse significado, como limite, talvez nos ajude a entender o verdadeiro significado da política, que é a arte de definir os limites, ou seja, o que é o bem comum (Gonçalves, 2002, p. 64). Para Arendt (2000), a pluralidade é a "condição pela qual" (conditio per quam) da política, implica e tem por função a conciliação entre pluralidade e igualdade. Quando entendemos política a partir da origem do termo, como limite, não falamos de regulação sobre a sociedade, mas de uma regulação dialética sociedade-Estado que favoreça a pluralidade e a igualdade social e política.
Por seu turno, o ambientalismo coloca-nos a questão dos limites que as sociedades têm na sua relação com a natureza, com suas próprias naturezas como sociedades. Assim, resgatar a política é fundamental para que se estabeleça uma ética da sustentabilidade resultante das lutas ambientalistas.
A educação ambiental nasce como um processo educativo que conduz a um saber ambiental materializado nos valores éticos e nas regras políticas de convívio social e de mercado, que implica a questão distributiva entre benefícios e prejuízos da apropriação e do uso da natureza. Ela deve, portanto, ser direcionada para a cidadania ativa considerando seu sentido de pertencimento e co-responsabilidade que, por meio da ação coletiva e organizada, busca a compreensão e a superação das causas estruturais e conjunturais dos problemas ambientais. Trata-se de construir uma cultura ecológica que compreenda natureza e sociedade como dimensões intrinsecamente relacionadas e que não podem mais ser pensadas — seja nas decisões governamentais, seja nas ações da sociedade civil — de forma separada, independente ou autônoma (Carvalho, 2004).
Considerando a ética da sustentabilidade e os pressupostos da cidadania, a política pública pode ser entendida como um conjunto de procedimentos formais e informais que expressam a relação de poder e se destina à resolução pacífica de conflitos, assim como à construção e ao aprimoramento do bem comum. Sua origem está nas demandas provenientes de diversos sistemas (mundial, nacional, estadual, municipal) e seus subsistemas políticos, sociais e econômicos, nos quais as questões que afetam a sociedade se tornam públicas e formam correntes de opinião com pautas a serem debatidas em fóruns específicos.
O meio ambiente como política pública, não pontual, no Brasil, surge após a Conferência de Estocolmo, em 1972, quando, devido às iniciativas das Nações Unidas em inserir o tema nas agendas dos governos, foi criada a SEMA (Secretaria Especial de Meio Ambiente) ligada à Presidência da República. Mas apenas após a I Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental de Tibilise, em 1977, a educação ambiental foi introduzida como estratégia para conduzir a sustentabilidade ambiental e social do planeta. Ainda na década de 1970, começou-se a discutir um modelo de desenvolvimento que harmonizasse as relações econômicas com o bem-estar das sociedades e a gestão racional e responsável dos recursos naturais que Ignacy Sachs (1986) denominou de ecodesenvolvimento.
Em 1983, sob a presidência da primeira-ministra norueguesa Gro Brudtland, foi criada a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e, em 1987, a comissão publicou Nosso futuro comum, que ficou conhecido também como Relatório Brudtland. A partir desse relatório, o conceito de desenvolvimento sustentável passou a ser utilizado em substituição à expressão ecodesenvolvimentoe constituiu a base para a reorientação das políticas de desenvolvimento e sua relação direta com as questões ambientais.
Atualmente, o conceito de desenvolvimento sustentável indica claramente o tratamento dado à natureza como um recurso ou matéria-prima destinado aos objetivos de mercado cujo acesso é priorizado a parcelas da sociedade que detém o controle do capital. Este paradigma mantém o padrão de desenvolvimento que produz desigualdades na distribuição e no acesso a esses recursos, produzindo a pobreza e a falta de identidade cidadã.
Nesse sentido, passamos a vislumbrar como meta uma educação ambiental para a sustentabilidade socioambiental recuperando o significado do ecodesenvolvimento como um processo de transformação do meio natural que, por meio de técnicas apropriadas, impede desperdícios e realça as potencialidades deste meio, cuidando da satisfação das necessidades de todos os membros da sociedade, dada a diversidade dos meios naturais e dos contextos culturais. A educação ambiental entra nesse contexto orientada por uma racionalidade ambiental, transdisciplinar, pensando o meio ambiente não como sinônimo de natureza, mas uma base de interações entre o meio físico-biológico com as sociedades e a cultura produzida pelos seus membros. Leff (2001) coloca a racionalidade ambiental como produto da práxis, ou seja, seria "um conjunto de interesses e de práticas sociais que articulam ordens materiais diversas que dão sentido e organizam processos sociais através de certas regras, meios e fins socialmente construídos" (Leff, 2001, p. 134).
Essa concepção de educação ambiental foi parcialmente apropriada pela Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA–lei 9795/99) que em seu artigo primeiro define a educação ambiental como processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos e habilidades, atitudes e competências voltadas para conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade1.
Ainda enfatiza a questão da interdisciplinaridade metodológica e epistemológica da educação ambiental como "componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal" (art. 2º). Reforça a responsabilidade coletiva da sua implementação, seus princípios básicos, objetivos e estratégias. Esta lei fornece um roteiro para a prática da educação ambiental e na sua regulamentação (Decreto 4281/02) indica os Ministério da Educação e do Meio Ambiente como órgãos gestores dessa política.
Apesar de no Brasil existir a idéia de leis que "não pegam", uma lei existe para ser cumprida ou questionada, de modo que, logo após a promulgação da Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), foi criada no Ministério da Educação a Coordenação Geral de Educação Ambiental e no Ministério do Meio Ambiente, a Diretoria de Educação Ambiental como instâncias de execução da PNEA.
Assim, a educação ambiental insere-se nas políticas públicas do Estado brasileiro de ambas as formas, como crescimento horizontal (quantitativo) e vertical (qualitativo), pois enquanto no âmbito do MEC pode ser entendida como uma estratégia de incremento da educação pública, no do MMA é uma função de Estado totalmente nova.
Uma política pública representa a organização da ação do Estado para a solução de um problema ou atendimento de uma demanda específica da sociedade. Quanto a sua modalidade, as políticas públicas se dão por intervenção direta, porregulamentação, ou contratualismo. A perspectiva de políticas públicas do órgão gestor da educação ambiental, hoje, inclui essas três modalidades. O MEC e o MMA em seus respectivos setores de educação ambiental, pautados pelo ProNEA — Programa Nacional de Educação Ambiental — estão implantando programas e projetos junto às redes públicas de ensino, unidades de conservação, prefeituras municipais, empresas, sindicatos, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, consórcios e comitês de bacia hidrográfica, assentamentos de reforma agrária, dentre outros parceiros.
Indubitavelmente, a educação ambiental, no âmbito do Estado, enquadra-se naquilo que Bourdieu (1998) denomina "mão esquerda do Estado", que reúne trabalhadores sociais, educadores, professores e cujas ações são ignoradas pela chamada "mão direita do Estado" (áreas de finanças, de planejamento, bancos). Ao operar na reparação dos danos sociais e ambientais da lógica de mercado, os sujeitos da "mão esquerda" podem, muitas vezes, se sentir iludidos e desautorizados em função dos paradoxos vividos de forma crônica, como falta de recursos, luta pela biodiversidade convivendo com avanço das fronteiras agrícolas por monoculturas ou transgênicos, grandes obras com alto impacto, revisão de antigas conquistas etc. Em lugar de imobilização lamentosa, temos a convicção de que ações educacionais participativas pela responsabilidade ambiental resultam no envolvimento e na organização de pessoas e grupos sociais nas lutas pela melhoria da qualidade vida fundamentada em valores pós-materialistas, que questionam as necessidades materiais simbólicas de consumo e desvelam outras possibilidades de felicidade, alegria e vida.
Segundo essa convicção, o papel do Estado na educação ambiental brasileira poderá ser subsidiário e definido por meio de um diálogo democrático com os diferentes sujeitos desta política. Continuamos concordando com Sachs (2004) quando afirma que hoje, sem negar a necessidade de reduzir as administrações pletóricas, precisamos aumentar os serviços públicos sociais, fortalecendo a "mão esquerda" do Estado. A Inglaterra, que já foi exemplo de política de redução do Estado gerou quinhentos mil empregos adicionais nos serviços públicos nos últimos oito anos (1997-2004). A reforma de Estado, que implica o aumento de sua eficiência, não implica de forma alguma a sua redução, pois em setores da regulação pública como educação e ambiente é clara a necessidade de se ampliar horizontal e verticalmente o Estado brasileiro.

No Ministério do Meio Ambiente – MMA
Seguindo o princípio da publicização e democratização das políticas públicas, o Ministério do Meio Ambiente tem se orientado para programas que vislumbrem a possibilidade do envolvimento de 100% da população brasileira. Reconhecendo os limites operacionais do Estado para tal realização como intervenção direta, tem buscado formas subsidiárias que possibilitem estas políticas amplas e democráticas. Podemos citar alguns programas e projetos voltados aos municípios e suas articulações regionais, como os consórcios e comitês de bacia hidrográfica destinados ao envolvimento de cada um dos moradores da região que precisam e podem ser potencializados nas suas lutas cotidianas.
Municípios educadores sustentáveis e formação de educadores ambientais são dois programas desenhados para se realizarem por meio de parcerias com as CIEAs — Comissões Interinstitucionais de Educação Ambiental — redes de educação ambiental, governos estaduais e municipais, universidades, consórcios municipais ou comitês de bacia hidrográfica, gerências do IBAMA e outros órgãos públicos federais e estaduais, que atuam em cada região deste imenso país. Destinam-se a promover o questionamento de um modo de produção e consumo que destrói a biodiversidade e compromete a sobrevivência, procurando promover mudanças de atitudes e comportamentos e ações coordenadas de melhoria das condições socioambientais.
A estratégica proposta é a do compromisso de um conjunto de municípios de uma eco-região2 com a implementação de quatro processos educacionais:
1 — formação de educadores ambientais, por meio de programas oferecidos por parceiros chancelados pelo MMA, que possibilitem a capilaridade e enraizamento do processo;
2 — educomunicação socioambiental (difusa, de massa): estratégias de comunicação com finalidade educacional e de tomada de decisão, envolvendo a produção e distribuição de materiais educacionais, campanhas de educação ambiental e o uso de meios de largo alcance;
3 — estruturas educadoras: municipais, da escola à praça pública; do viveiro à horta comunitária, dentre outras, nas quais, ou a partir das quais, acontecem ações ou projetos voltados para a sustentabilidade, que devem ter por objetivos a transformação da qualidade de vida e também a definição e implementação de seu papel educador;
4 — foros e coletivos: são os diferentes espaços de participação democrática que se propõem a realizar projetos e ações em prol da sustentabilidade, ao mesmo tempo em que discutem valores, métodos e objetivos de ação.
O primeiro deles, a criação de quadros de formadores de educadores ambientais, contribui para implementar os outros três e, ao descrevê-los sucintamente, deixamos sinalizadas as características básicas, que consideramos importante para todo e qualquer projeto de educação ambiental, que tenha a biodiversidade, ou outra questão, como tema gerador, mas que tenha por compromisso maior a educação das pessoas para a vida.
A formação desses educadores ambientais orienta-se por três eixos pedagógicos indissociáveis: a intervenção socioeducacional como práxis pedagógica, o estabelecimento de comunidades interpretativas e de aprendizagem e o acesso autogerido a cardápios de conteúdos e instrumentos pertinentes à problemática socio-ambiental de cada contexto. Para o estabelecimento de programas amplos e continuados de formação, a DEA/MMA tem por estratégia a articulação, a orientação e o apoio a coletivos educadores, entendidos como conjuntos de instituições com capacidade instalada para operar processos de formação (universidades, movimentos, ONGs, federações sindicais, pastorais, Secretarias de Estado, NEAs do IBAMA, EMBRAPAs, órgãos estaduais e federais de pesquisa e extensão etc.).
As ações da equipe da DEA/MMA concentram-se na costura das parcerias para a execução das propostas e agendas com as diversas instituições e grupos sociais de cada Estado para o estabelecimento das CIEAS, com as instituições que atuam com formação de educadores ambientais, com grupos de municípios, com instituições de governo. Além disso, busca-se o desenvolvimento de instrumentos de apoio transversal às CIEAS, aos municípios educadores sustentáveis, aos coletivos educadores, aos programas de formação de educadores tais como o SIBEA, às "salas verdes", documentos de subsídio técnico, publicações, plataformas de educação à distância, salas virtuais, apoio a oficinas de trabalho, dentre outras.

No Ministério da Educação – MEC
Questões ambientais abrangentes, bem como áreas mais específicas são trabalhadas a partir de uma visão sistêmica, baseada em quatro ações estruturantes – Conferência Nacional de Meio Ambiente, Formação Continuada de Professores e Estudantes, Inclusão Digital com Ciência de Pés no Chão, Educação de Chico Mendes. O programa do MEC propõe-se a construir um processo permanente de educação ambiental na escola. Por meio de modalidades de ensino presenciais, à distância e difusas, as ações envolvem secretarias de educação estaduais e municipais, professores, alunos, comunidade escolar, sociedade civil e universidade. Ele dá continuidade à sensibilização iniciada na Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente, bem como ao processo de capilarização dos Parâmetros em Ação/Meio Ambiente.
Para tornar-se efetivo e sustentável, é incentivada a instalação de Com-Vida (Comissão de Meio Ambiente e Qualidade de Vida) na escola, com a participação dos Conselhos Jovens pelo Meio Ambiente, a implementação da Agenda 21 na Escola, dando suporte a atividades curriculares e extracurriculares.
Em 2003 os Ministérios do Meio Ambiente e da Educação lançaram a campanhaVamos cuidar do Brasil com a Conferência Nacional do Meio Ambiente, com uma versão adulta e uma para jovens, idealizada pela ministra Marina Silva. A Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente contou com a participação direta de quase dezesseis mil escolas, onde cerca de seis milhões de pessoas entre estudantes, professores e comunidades debateram questões ambientais. Esse movimento incluiu, além das escolas regulares do ensino fundamental, escolas indígenas, quilombolas, ribeirinhas, caiçaras, de assentamento, de pescadores e de portadores de necessidade especiais.
Em termos de conteúdos de trabalho, o processo da Conferência tornou a escola um espaço para a comunidade debater como vamos cuidar da nossa água, dos seres vivos, dos nossos alimentos, da nossa escola e da nossa comunidade, objetivo alcançado por meio de um documento orientador, chamado "Passo a passo para a Conferência do Meio Ambiente na escola". Cada conferência na escola elegeu um delegado ou delegada e seu suplente, definiu uma proposta de política ambiental e elaborou um cartaz que mostrava para sua comunidade a proposta sobre como Vamos cuidar do Brasil. As propostas foram sistematizadas3 de forma descentralizada e pública, via internet, em todos os estados.
Como as conferências são bienais, na II Conferência Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente, com o tema Vivendo a diversidade nas escolas, adotou-se uma política de popularização de acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário: a Convenção sobre a Diversidade Biológica, a Convenção de Mudanças Climáticas, a Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar e Nutricional e a Declaração de Durban da Conferência Mundial contra o Racismo.
Com esta iniciativa, o governo brasileiro atende os princípios de divulgação presentes em todos esses documentos internacionais, bem como na Agenda 21, cujo capítulo 25 estabelece que os governos, de acordo com suas estratégias, devem tomar medidas para permitir a participação da juventude nos processos de tomada de decisões relativas ao meio ambiente. Apesar de a maioria dos jovens (85%) não participarem de grupos, 57% gostariam de participar de grupos de defesa de meio ambiente e 60% de associação ou conselhos ligados à educação4 . Esses dados são confirmados na Carta Jovens Cuidando do Brasil (Deliberações da Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente), na qual eles sugerem a valorização dos espaços de participação por meio da criação de conselhos jovens nas escolas, ONG's, e grêmios juvenis. Eles reafirmam a importância da implementação das agendas 21 locais e do envolvimento dos diversos setores da sociedade na superação dos desafios. Ecologia e meio ambiente é para 26% dos jovens brasileiros o assunto mais importante a ser discutido pela sociedade5.
Na educação formal, o Órgão Gestor da PNEA, por intermédio do MEC, tem o desafio de apoiar professores a se tornarem educadores ambientais abertos para atuar em processos de construção de conhecimentos, pesquisa e intervenção educacional com base em valores voltados à sustentabilidade6 em suas múltiplas dimensões. Em termos estratégicos, de forma integrada ao Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), foi criada, como continuidade da Conferência, uma grande ação presencial de formação de professores para potencializar o enraizamento da educação ambiental a partir de uma ética ecológica que promova transformações empoderadoras dos indivíduos, grupos e sociedades. Portanto, o aprofundamento conceitual e prático é trabalhado em função das seguintes linhas:
  • prover materiais instrucionais, que permitam o acesso à informação e ao conhecimento;
  • criar instâncias regulares de debates, pesquisa e ação nas escolas para a produção de conhecimentos locais significativos;
  • fomentar a relação escola-comunidade, facilitada pelas Comissões de Meio Ambiente e Qualidade de Vida nas Escolas (Com-Vida).
Uma ação delineada é a implantação de um sistema informatizado, pelo qual transitarão aplicativos para pesquisa escolar sobre o meio ambiente, especialmente sobre biodiversidade. Essa rede de pesquisa nas escolas traz o levantamento e disponibiliza conhecimentos locais sem necessitar de procedimentos laboratoriais sofisticados e caros. As informações das escolas, da flora, fauna, clima, água no seu entorno e microrregião, serão georeferenciadas, com orientação para coleta fidedigna e resultados descritivos padronizados. Na internet, como uma área do SIBEA, será possível a construção de um "atlas coletivo" de temas como biodiversidade, qualidade da água, situação socioambiental das comunidades, alimentação. Trata-se de uma forma de aprendizagem significativa que segue o pensamento de Vigotsky no sentido de ser mediada, cooperativa, social e negociadora.
Em 2004, foi adotado um livro como tema gerador para articular as atividades nas escolas: Consumo sustentável: um manual de educação (Idec / MMA / MEC, 2004). Escolher apenas um material para professores de mais de quatro mil municípios de todos os estados, regiões, biomas e estratos sociais do país constitui uma grande dificuldade. Foi adotado um livro que trouxesse uma base comum de conteúdos, complementada por uma pedagogia de projetos que permitisse a construção coletiva. A questão ambiental é apresentada em diversos temas (água, biodiversidade, transportes, alimentação, energia e publicidade), a partir de um apelo a uma nova postura diante do consumo: a consciência de que precisamos nos envolver pessoalmente e ao mesmo tempo em movimentos coletivos de transformação paradigmática. Nesse sentido, o conhecimento é fundamental para uma leitura crítica da realidade e para se buscar formas concretas de atuar sobre os problemas ambientais. A relevância deste livro está no fato de ele propor novos conceitos sobre os padrões de relação da sociedade moderna com o consumismo e a natureza, de maneira orgânica, interdisciplinar e transversal em relação ao currículo escolar como um todo.
A educação ambiental, por não estar presa a uma grade curricular rígida, pode ampliar conhecimentos em uma diversidade de dimensões, sempre com foco na sustentabilidade ambiental local e do planeta, aprendendo com as culturas tradicionais, estudando a dimensão da ciência, abrindo janelas para a participação em políticas públicas de meio ambiente e para a produção do conhecimento no âmbito da escola.
Buscamos formas abertas e inovadoras de construir juntamente com formadores, professores e alunos aquilo que Edgar Morin chama de conhecimento pertinente, que possibilita apreender os problemas globais e fundamentais para neles inserir os conhecimentos parciais e locais. Nesses dois saberes têm-se implícita a busca de um conhecimento complexo, não fragmentário e que se amplia continuamente sem, entretanto, trazer um conhecimento totalizador, também limitado. O conhecimento pertinente reconhece que, em meio à complexidade do real, nunca é possível a compreensão total. É por isso, também, que a busca do conhecimento se torna um esforço infinito, mas que pode se tornar um círculo virtuoso.
Por não se tratar de uma disciplina, a educação ambiental permite inovações metodológicas na direção do educere — tirar de dentro — por ser necessariamente motivada pela paixão, pela delícia do conhecimento e da prática voltados para a dimensão complexa da manutenção da vida.
Por um lado, pensamos na diversidade de saberes e complexidade dos sistemas naturais e sociais. Por outro, a nossa "pedagogia da práxis" envolve um trabalho com a simplicidade do natural, de materiais didático-pedagógicos, do diálogo e de compartilhar experiências e conhecimentos. Para darmos conta da complexidade das dinâmicas do mundo contemporâneo, optamos pela arte da simplicidade. Isso só pode ser feito se tivermos a clareza de que na sociedade moderna são confundidas complexidade e complicação, de um lado e de outro, simplicidade (a essência do complexo) e ser simplista, isto é, reduzir a biodiversidade a recursos naturais e tudo a mercadoria, portanto, algo a ser consumido.
Com essa visão sistêmica e participativa, espera-se que esses processos educacionais permitam incentivar educadores e educadoras ambientais a acreditarem em sua capacidade de atuação individual e coletiva, ao se apropriarem de conceitos, readequando métodos, incrementando técnicas e melhorando suas práticas cotidianas.

Articulação MEC/MMA na formação de educadores ambientais
O MEC e o MMA, em consonância com a Política Nacional de Educação Ambiental e o Programa Nacional de Educação Ambiental, desenvolvem propostas de formação de educadores(as) ambientais. Ambos atuam junto aos seus públicos específicos dentro de uma perspectiva crítica, popular e emancipatória e almejam desvelar processos continuados articulados com processos transformadores a partir de uma visão sistêmica e permanente do processo educacional, em detrimento de cursos pontuais ou de um ativismo vazio.
Nesse sentido, quanto mais aprofundada for a articulação metodológica, de fato, tanto mais será potencializada a sinergia das ações dos Ministérios. Podemos vislumbrar três instâncias de articulação: a do desenho metodológico, a das oficinas de formação e a dos instrumentos de apoio.
Em todas essas instâncias existem diferentes níveis de interação entre as ações desenvolvidas que são aprofundados e ampliados conjuntamente. Essa proposta foi criada no âmbito das oficinas de formação a serem implementadas em ao menos seis pólos da Bacia do São Francisco, em quatro pólos da Bacia do Alto Paraguai/ Pantanal e também em pólos da Bacia do Paraná III/ Itaipu, podendo ser replicada para outros contextos.

Articulação metodológica
As idéias da pedagogia da práxis (MMA-DEA) e da pedagogia de projetos coletivos e transformadores (MEC-CGEA) convergem como eixos pedagógicos que consolidam a formação dos(as) educadores(as) ambientais. As idéias de coletivos de participação política e de aprendizagem solidária também são marcas da convergência das propostas. A articulação metodológica implica o conhecimento complexo, não fragmentário e que se amplia continuamente, sem buscar um conhecimento totalizador, também limitado, como já indicamos.
São definidos, portanto, alguns itens nos quais facilitadores (MEC-CGEA) e enraizadores (MMA-DEA) podem se orientar para articular as metodologias de formação:
  • Coletivos educadores: o interesse na perspectiva continuada de educação se dá na inclusão dos professores e professoras formados em seminários, de modo que sejam incentivados a garantir esta continuidade participando dos coletivos educadores formados para cada pequena região (oito a vinte municípios) e articulados em rede no âmbito de uma bacia ou de um Estado. É interessante pensar numa estratégia articulada, MEC-MMA, para a consolidação de tais coletivos.
  • Com-Vida-MES: as Com-Vidas podem ser articuladoras de processos de Municípios Educadores Sustentáveis na medida em que se articulam (entre escolas, entre municípios) e na medida em que deflagram um processo de Agenda 21. A Com-Vida propõe-se a fazer educação, propiciando um espaço estruturante da educação ambiental na escola que seja colaborativo e includente. A sinergia dos esforços de ambos os ministérios se dá através de contribuições do MMA à participação das Com-Vidas no Município Educador Sustentável.
  • Tema gerador–cardápio: o tema gerador consumo sustentável pode ser entendido como um deflagrador de um encontro dialógico no qual outros temas emergem, podendo haver outros temas geradores, que podem ser vistos como porta de entrada para o conhecimento pertinente e não como fins em si mesmos. O tema gerador potencializa cardápios pela interlocução na diversidade, pelo diálogo e pela construção coletiva de percursos e trajetos abertos. É fundamental, para tanto, o desenvolvimento, em parceria com os coletivos educadores, de um cardápio nacional de conteúdos e competências que possam ser acessados pelos grupos e educadores participantes das iniciativas locais.
  • Grupos PAP – Comunidades interpretativas de aprendizagem/professores educadores ambientais: na concepção de comunidades de aprendizagem e interpretativas, pretendemos que, em cada município, haja pelo menos um grupo, mediado por um membro do grupo PAP-Coletivo Educador, que se reúne periodicamente com os educandos para oferecer itens de cardápio de conteúdos e para debater os projetos. A inclusão de alguns ou de todos os professores Formadores daquele município, assim como os gestores da secretaria de educação, torna-os também membros dos PAP.

Articulação em oficinas
A articulação aprofundada se dará, a exemplo do processo de formação da Bacia do São Francisco por meio de oficinas com quatro dias de trabalho. Nesses dias, o primeiro e o último seriam comuns, ou seja, nossos públicos estariam juntos olhando para o contexto comum e articulando as estratégias:
1º dia — Análise de conjuntura: o contexto do São Francisco (ou de outra região), os projetos MMA-MEC para aquele contexto (no caso do São Francisco o de revitalização), o contexto local (para fazer a análise de conjuntura mais local, os conflitos por recursos, o cenário socioambiental, as tendências, o cenário institucional, toda ela mediada por um parceiro local); desenvolvimento coletivo de um quadro da problemática socioambiental, discussão sobre a concepção da formação do educador ambiental e reflexão sobre os desafios do educador ambiental frente a esse quadro.
2º e 3º dias — Pautas específicas: nestes dois dias cada parceiro desenvolve sua pauta com seu público mais específico. O MEC-CGEA conduz processos de formação com professores e alunos; o MMA-DEA conduz a mediação da oficina para formação do núcleo PAP-Coletivo Educador da região.
4º dia — Articulação: os grupos apresentam suas agendas e negociam a articulação de:
• MES/ Agenda 21/ Com-Vida; • Comunidades de aprendizagem e interpretativas dos municípios; • Articulação dos projetos.

Instrumentos e materiais de apoio
É importante que, em cada contexto, e também de forma geral, sejam produzidos materiais de apoio e instrumentos comuns que facilitem o entendimento dos técnicos dos Ministérios e a percepção da sinergia dos processos desenvolvidos pelos educadores(as) ambientais que aderem às propostas de formação. De antemão sugerimos três materiais iniciais:
  • texto comum problematizador que situe o desafio de cada contexto (São Francisco, Pantanal, Amazônia etc.) e o papel da educação ambiental no enfrentamento da problemática socioambiental;
  • levantamento de materiais didáticos de produção regional e instituições que convergem com a proposta para que possamos, juntos, articular nossos parceiros;
  • texto com a proposta comum de trabalho que demonstre o diálogo entre os espaços de participação política, os projetos de intervenção educacional e os processos formativos.
A partir da experiência de articulação na Bacia do São Francisco, iremos aprofundando o diálogo, sistematizando e produzindo sinergia nas estratégias, ações, conceitos, materiais didáticos, parceiros, públicos e recursos.

Considerações finais
Analisando as propostas do órgão gestor em termos das modalidades das políticas públicas, pode-se entendê-las sob a perspectiva do contratualismo e como regidas pelo princípio da subsidiariedade (Castells, 1999). Para con-substanciar esta afirmativa os exemplos e as ações apresentadas mostram que o Estado assume o estímulo, o subsídio e o certificado de parcerias entre instituições formadoras, que já têm por função precípua a formação de educadores ou que podem passar a assumir tal função, de modo a garantir um processo continuado de formação de educadores ambientais.
De outra forma, caso o Estado decidisse desenvolver seu programa de formação por intervenção direta, isto exigiria a contratação e a capacitação de equipes enormes alocadas em todos os estados da federação. Além de não ser factível, tal forma de execução seria contraditória com o reconhecimento de que a educação ambiental deve ser desenvolvida em profundo diálogo com os sujeitos e as instituições de cada região. A proposta dos Municípios Educadores Sustentáveis (MES) também visa ao estabelecimento de contratos entre municípios, dos municípios com seus habitantes, com as instituições regionais e com os conselhos, para garantir um processo educador e gestor da sustentabilidade municipal. Todo o esforço do governo entre 2003 e 2006 reside na concepção dos contratos e na articulação técnica e política para criá-los. Com o tempo, uma função de subsidiariedade da ação do Estado se tornará mais clara e essas ações serão definidas em diálogo com verdadeiros observatórios da educação ambiental, compostos pelas diversas instituições enredadas na execução de processos públicos de educação ambiental. Em princípio, cremos que tais ações subsidiárias serão bastante diversas, tais como apoio a encontros interinstitucionais, linhas de financiamento via Fundo Nacional do Meio Ambiente, bancos de dados de experiências (SIBEA), publicações de interesse transversal às diversas iniciativas públicas, certificação pública etc.
Como política pública, algumas modalidades da ação do MEC se enquadram mais na perspectiva da intervenção direta, o que é natural, uma vez que tal intervenção incide principalmente sobre a educação pública, que já possui toda a sua estrutura como política realizada diretamente pelo Estado. O objetivo é inserir a educação ambiental no cotidiano da educação pública em todos os níveis de ensino.
Castells (1999) fala de oito princípios do Estado em rede que dialogam, de modo geral, com a perspectiva de políticas públicas que temos desenvolvido: asubsidiariedade, que dialoga com descentralização; a flexibilidade; a coordenação; a participação cidadã; a transparência administrativa; a modernização tecnológica; a transformação dos agentes da administração, que implica a valorização dos recursos humanos do Estado, e a retroação na gestão (conseqüência da dialogicidade na implementação nas políticas).
Com o tempo, podemos imaginar que ambos os setores de educação ambiental — do MEC e do MMA — terão capilaridade junto aos coletivos educadores, que se tornarão um dos principais parceiros para o desenvolvimento das políticas públicas de educação ambiental. Esta modalidade, mais próxima do contratualismo, e as ações mais próximas à perspectiva da subsidiariedade, não significam, de modo algum, uma redução do papel do Estado ou uma menor importância na manutenção de uma boa estrutura público-governamental para a implementação das políticas públicas de educação ambiental. Pelo contrário, cada vez mais esperamos que a sociedade se organize, as instituições se envolvam e qualifiquem suas demandas, para que os governos subsidiem suas práticas de educação ambiental. Santos (1999) fala de uma "articulação entre os princípios de Estado e da comunidade sob a égide deste último", entendendo, portanto, o "Estado como novíssimo movimento social". No limite, essa oposição às perspectivas de Estado mínimo, mero administrador de contratos de mercado, significa um Estado reformado, e talvez ampliado, pelo diálogo com a sociedade civil:
A regulação social que emerge desta nova forma de política é muito mais ampla e férrea que a regulação protagonizada pelo Estado no período anterior, mas como é também muito mais fragmentada e heterogênea, quer quanto às suas fontes, quer quanto à sua lógica, é facilmente dissimulada como desregulação social. Aliás, boa parte da nova regulação social ocorre por subcontratação política com diferentes grupos e agentes em competição, veiculando diferentes concepções dos bens públicos e do interesse geral. (Santos, 1999, p.265)
Uma questão importante é qual educação ambiental será regulada, tendo o atual governo uma perspectiva clara de que ela deve ser popular, crítica e emancipatória. Futuros governos podem não pactuar com essa perspectiva, mas esperamos que se constitua, no seio da sociedade civil, um conjunto articulado que não permita o abandono de ações de Estado que subsidiem esta perspectiva. As políticas públicas em educação ambiental, desta forma, são um processo dialético e partilhado do Estado e da sociedade civil.

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 Endereço para correspondência
Marcos Sorrentino
Programa Nacional Educação Ambiental (MMA)
Espl. dos Ministérios, Bloco B, 5º andar, sala 553
7066-900 – Brasília – DF
e-mail:
marcos.sorrentino@mma.gov.br
Recebido em 26.04.05
Aprovado em 09.06.05


Marcos Sorrentino é diretor de Educação Ambiental no Ministério do Meio Ambiente.
Rachel Trajber é coordenadora geral de Educação Ambiental no Ministério da Educação.
Patrícia Mendonça é consultora técnica da Coordenação-Geral de Educação Ambiental no MEC.
Luiz Antonio Ferraro Junior é professor no Departamento de Tecnologia da Universidade Estadual de Feira de Santana, doutorando na Universidade de Brasília e consultor da Diretoria de Educação Ambiental no Ministério do Meio Ambiente.
1. Dizemos parcialmente porque ela não se volta apenas à conservação do meio ambiente (no caso colocado como uma externalidade da sociedade) mas também à sua recuperação e melhoria e, acima de tudo, destina-se à melhoria da qualidade de vida de todos, humanos e não-humanos.
2. Como os 29 municípios do Paraná III, todos os municípios da Bacia do Alto Paraguai, ou os trechos da Bacia do São Francisco, por exemplo.
3. Ver site www.mma.gov.br/propostasdasescolas/
4. Resultados da pesquisa Perfil da Juventude Brasileira, iniciativa do Projeto Juventude/Instituto Cidadania, Instituto de Hospitalidade e do Sebrae realizada em dezembro de 2003.
5. O texto original apresenta as propostas sobre os temas água, escola, comunidade, alimentos e seres vivos.
6. De acordo com autores como Ignacy Sachs, as dimenões da sustentabilidade são social, ambiental, econômica, cultural, política, ética e espacial.

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